sábado, 28 de junho de 2008





Notas Biográficas

A história da Amazônia, e de Rondônia em particular, certamente são desconhecidas da grande maioria dos nossos "visitantes" de outros estados. Parece mesmo não ser exagero generalizar, dizendo que quase tudo o que diz respeito a essa enorme parcela do Brasil ainda não faz parte do conhecimento comum do brasileiro, ou que é informado de modo distorcido.
1. Primórdios.

Os primeiros contatos do mundo português com a região noroeste do Brasil ocorreram ao longo do século XVII. Em meados daquele século, Antonio Raposo Tavares, vindo pelo rio Mamoré atingiu o rio Madeira, percorreu toda sua extensão, e desceu o rio Amazonas até a foz. Quando os franceses foram expulsos do Maranhão, as medidas tomadas pela coroa portuguesesa para impedir conquistas de terras por parte de outras nações na região levou a fundação do Forte do Presépio de Santa Maria de Belém, e, com base nele, à penetração e construção de fortins na bacia do rio Amazonas.

Às ações da coroa juntaram-se os jesuítas, que em 1669 fundaram na foz do rio Madeira a missão de Tupinambarana. Daí iniciaram a penetração do vale do rio Madeira. Foi o padre jesuíta João Sampaio o fundador da aldeia de Santo Antonio das Cachoeiras, onde muitos anos depois pretendeu-se estabelecer o ponto inicial da E.F. Madeira Mamoré.

Porém, fora os aldeamentos jesuíticos que tinham algum sentido de perenidade, não haviam esforços de fixação na terra para produção de riquezas. Apenas exploravam-se as riquezas da floresta e o trabalho indígena.

Em toda a região, o maior foco de lutas por conquistas territoriais era o vale do rio Guaporé, com os espanhois que se haviam fixado na região que hoje faz parte da Bolívia. Alí, ao longo da primeira metade do século XVIII travaram-se inúmeras batalhas pela posse do lado direito do rio.

Lutavam, portugueses e espanhois, pelas jazidas auríferas descobertas na província de Mato Grosso (em Bom Jesus, atual Cuiabá, e Vila Bela), durante o processo de avanço dos portugueses em direção ao oeste, a despeito do inócuo Tratado de Tordesilhas que consignava aquelas terras ao Rei de Espanha. E depois, para estabelecer melhores posições para dar cumprimento aos Tratados de Limites bilaterais, quando adotaram o princípio do Uti Possidetis (a posse pelo uso), como forma de resolver sem combate armado suas questões de fronteiras.

Para garantir as conquistas portuguesas, o governador da província de Mato Grosso Luis Albuquerque de Melo e Cáceres, determinou a construção de uma fortificação nas proximidades do local da antiga Aldeia de Santa Rosa (espanhola, na margem esquerda do rio Guaporé). As obras de construção do Real Forte do Principe da Beira foram executadas entre 1776 e 1783.

O 1º Ciclo da Borracha
O isolamento em relação ao resto do país foi o fato mais marcante da vida dos povos da Amazônia nos primeiros 4 e meio séculos do descobrimento. Como não mais ocorreram descobertas de ouro ou minerais preciosos além de Vila Bela, nem a coroa portuguesa, nem o império brasileiro posteriormente, demonstraram maior interêsse na região pacificada e de domínio consolidado.

Vivendo do extrativismo vegetal, o desenvolvimento da economia regional é caracterizada por ciclos, períodos em que algum dos recursos naturais em que a região é pródiga alcançava bom preço no mercado.

Assim foi que o desenvolvimento tecnológico e a revolução industrial na Europa, transformaram a borracha, então um produto exclusivo da Amazônia, em produto de grande demanda e preço elevado. Desde o início da segunda metade do século XIX, a borracha passou a exercer forte atração sobre empreendedores visionários. Assim:
Em 1867 os engenheiros José e Francisco Keller exploraram a região das cachoeiras do Rio Madeira, para locação de uma ferrovia.

Em 1869 George Earl Church, engenheiro norte-americano obteve concessão do governo da Bolívia para organizar e explorar uma empresa de navegação ligando os rios Mamoré e Madeira. Posteriormente os planos foram modificados para a construção de uma ferrovia.

Em 1870, o mesmo Church recebe do governo do Brasil permissão para construir uma ferrovia ao longo do trecho encachoirado do Rio Madeira.

Lutas por questões fronteiriças tornariam a ocorrer na região no final do século XIX, com a questão do Acre, provocada pela exploração de borracha pelos brasileiros em terras da Bolívia. As riquezas obtidas com a venda da borracha haviam ajudado a consolidar a jovem república brasileira, após a desorganização da economia provocada pelo final da odiosa prática da escravidão humana, pelo proverbial descompromisso da elite dirigente com a Nação, e pela proclamação da República.

Foi somente após o efetivo controle das terras do Acre conseguida por Plácido de Castro e seus liderados, em parte financiados pelos "barões da borracha" de Manaus, que o governo Central do Brasil adotou medidas efetivas para consolidar sua posse. Esta efetivou-se com o Tratado de Petrópolis de 1905, que incorporou a área ao território brasileiro e obrigou o Brasil a construir uma ferrovia que, superando o trecho encachoeirado do rio Madeira, possibilita-se o acesso dos produtos bolivianos, borracha principalmente, aos portos brasileiros do Atlântico (Belém do Pará, na foz do Amazonas, inicialmente).

Em 30 de abril de 1912 foi concluída a Estrada de Ferro Madeira Mamoré, com a chegada do primeiro comboio à cidade de Guajará Mirim, fundada nessa mesma data.
Era tarde. A Amazônia perdera a primazia do monopólio de produção da borracha. Os seringais plantados pelos ingleses na Malásia com sementes oriundas da Grande Floresta, passaram a produzi-la com maior eficiência e produtividade, assumindo o controle do comércio mundial do produto.

O 1º ciclo da borracha, que movimentou a economia da região e trouxe as primeiras grandes levas de migrantes, principalmente da região nordeste, durou cerca de 50 anos. Deixou como herança a EF Madeira-Mamoré e as cidades de Porto Velho e Guajará Mirim. De resto era a grande floresta. Imensa, desconhecida, quase inpenetrável. Encerrado esse ciclo, a economia regional viveu um longo período de completa estagnação.


O Ciclo do Telégrafo
Como toda a Amazônia, após o declínio do 1º ciclo da borracha Rondônia passou por um período de estagnação econômica (vale observar que aqui, Rondônia, refere-se a regiões pertencentes aos estados de Mato Grosso e Amazonas, visto que o antigo Território do Guaporé somente foi criado em 1943).

O esvaziamento econômico e o isolamento desta vasta região fez com que o Governo Central decidisse construir uma linha telegráfica entre Cuiabá (MT) e Porto Velho(AM), cortando todo o norte do Mato Grosso, então uma imensa e desconhecida floresta. Grande parte da região cortada pela linha veio a constituir o atual estado de Rondônia.

O então Coronel Cândido Mariano da Silva Rondon assumiu o comando da missão. Entre 1907 e 1915 Rondon trabalhou utilizando mão de obra do sul do país. Estes trabalhadores, somados a outros migrantes atraídos pelo avanço da linha telegráfica, criaram povoados nos locais onde se instalaram os postos telegráficos, entre os quais: Vilhena, Marco Rondon, Pimenta Bueno, Vila Rondônia (hoje, Ji Paraná) e Ariquemes.

A expedição Rondon

A expedição Rondon contribuiu para a ocupação desta região, desbravando-a e demarcando os antigos seringais. Além do espírito desbravador que lhe valeu a alcunha de o "último bandeirante", Rondon mostrou um espírito humanista raramente encontrado, sendo grandemente responsável pela mudança na forma de ver e tratar os índios, habitantes primeiros deste vasto país. Criou o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), origem da atual FUNAI.

Sua maneira de encarar o contato com nossos irmãos das matas, perseguidos e mortos aos milhares sob os argumentos e bandeiras do progresso, do avanço da civilização e da salvação pela fé religiosa, pode ser resumido na célebre frase: morrer, se preciso for, matar nunca !

Ao contrário dos movimento anteriores cujas ações transcorreram ao norte da região no sentido oeste, este ciclo ocorreu no sentido sul-norte. As fundações de vários municípios do estado, como Vilhena, Pimenta Bueno, Ji Paraná e outros são seu legado, e em sua esteira desenvolveu-se a ligação de Rondônia com os centros produtores e consumidores das regiões central e sudeste do país.


O 2º Ciclo da Borracha
Quando, durante a 2ª Guerra Mundial, as forças japonesas dominaram militarmente o Pacífico Sul, invadiram também a Malásia e assumiram o controle de seus seringais. Para suprir as Forças Aliadas da borracha imprescindível para a movimentação dos exércitos, os velhos seringais da Amazônia foram reativados. Isso trouxe um novo e volátil alento à economia regional, embora se possa dizer que a incapacidade empresarial e a falta de visão da elite dirigente regional tenham resultado na perda de mais esta oportunidade para aplicar uma política de efetivo desenvolvimento à região.

Milhares de nordestinos foram atraídos e trazidos para cá. Eram chamados os "soldados da borracha". Encerrada a guerra, reorganizadas as economias de vencedores e derrotados na Europa e Ásia, cessaram as atividades nos velhos e ineficientes seringais da Amazônia. E nova fase de estagnação abateu-se sobre a Hileia.


O Ciclo da Cassiterita e do Ouro.
Em 1958 garimpeiros descobriram grandes aluviões de cassiterita (minério de estanho) em áreas dos antigos seringais. Iniciou-se um período de extrativismo mineral, sob forma de garimpo. A garimpagem manual absorvia grande parte da mão-de-obra local, e atraia grandes contingentes humanos, concentrando-os em Porto Velho.

Nessa época, tentativas de implantação de colônias agrícolas falharam, seja devido ao desconhecimento de tecnologias agrícolas adequadas à região, seja pela concorrência mais forte do garimpo.

Em 1971 o Ministério das Minas e Energia proibiu a garimpagem manual, obrigando a mecanização da lavra. Em 1970 a garimpagem atingira seu pico, produzindo 4.721 ton de minério de estanho. Ao final da década de 70, Rondônia respondia por quase 70% da produção nacional. Em 1989 foram produzidas 54.192 ton, sendo 8.974 ton através da garimpagem novamente liberada.

Daí em diante a produção entrou em declínio, provocado pelas condições do mercado internacional do produto e conflitos legais entre garimpeiros e empresas mineradoras. A produção atual é pouco significativa.

O ouro foi descoberto no leito do rio Madeira. Era, em meados dos anos 80, junto com a cassiterita, os principais produtos de Rondônia, atraindo garimpeiros de todo o Brasil. Estima-se que em 1987 haviam cerca de 600 dragas e 450 balsas extraindo ouro do rio. Eram processos extrativos rudimentares, admitindo-se perdas em torno de 50%. O trabalho nas balsas era extremamente perigoso, pois obrigava um mergulhador operar a "maraca", o terminal do mangote de sucção, conduzindo-a no fundo do rio para fazer o desmonte em profundidades de até 15m.

Como era grande a evasão (pelo menos 50%), são imprecisas as estimativas de produção. Admite-se que no ano de 1987 tenha sido da ordem de 8.000 ton. Já no início dos anos 90 entrou em declínio, estando praticamente interrompida.
Este ciclo gerou muita riqueza, sendo porém quase nulos os benefícios duradouros produzidos.

Foi uma exploração predatória e de alto impacto ambiental. Pode-se dizer que, da exploração do ouro, a maior herança é o seu passivo ambiental: erosão do leito e das margens do rio, contaminação das águas e da cadeia alimentar pelo mercúrio, poluição por óleo, combustíveis e rejeitos lançados na água e por equipamentos abandonados, sedimentação do canal navegável, etc.

Nos denominados garimpos do Arara e Periquitos, as crateras abertas por desmonte hidráulico chegaram a comprometer a BR-425, que vai até Guajará Mirim. No local foram encontrados fósseis de mastodontes e tatu-gigante, entre outros. Esta bacia está sendo destruída, e seus fósseis contrabandeados.
Não deixou boas lembranças, este ciclo.


O Ciclo da Agricultura.
Cronologicamente sucede ao ciclo da cassiterita, tendo-se beneficiado dos agregados populacionais de todos os anteriores, consolidando Rondônia como estado produtor e entreposto comercial da região nor-noroeste do país.

Caracterizou-se por maciços investimentos federais nos projetos de colonização, e grande intensificação do fluxo migratório. Como consequência, e de forma desordenada, formaram-se rapidamente inúmeros aglomerados urbanos, e ocuparam-se efetivamente as terras ao longo da BR-364.

Este processo quebrou a estrutura espacial então existente, condicionada aos ciclos extrativistas, e de economia concentrada nas cidades de Porto Velho e Guajará Mirim. O eixo de importância econômica do Estado deslocou-se para os municípios que iam sendo criados ao longo da rodovia que é a espinha dorsal da vida econômica do Estado.
A ocupação e colonização do espaço físico exigiu maciças derrubadas e queimadas na floresta.

O contingente populacional sofreu incrementos explosivos, a infra-estrutura urbana era muito deficiente, e a malária tornou-se comum, quase um mal caseiro não fosse a gravidade da moléstia, atacando cerca de 130.000 rondonienses por ano.

Mas, apesar das enormes dificuldades, o trabalho de seu povo vem tornando a cada dia melhor nossas cidades. A saúde e a educação apresentam padrões superiores a vários estados federados, bem mais antigos. A produção cresce, a medida que as técnicas agrícolas vão se consolidando. O povo, como é de se esperar entre pioneiros, é forte e feliz.

A abertura desta nova fronteira agrícola no país só foi possível graças a BR-364. De 1960 quando se abriu o caminho pioneiro, até 1983/84 quando a rodovia foi asfaltada, a estrada se manteve aberta graças à "santa insanidade" daqueles que se aventuravam em percorrê-la, ficando incontáveis vezes retidos em areais imensos e atoleiros gigantes por dias e semanas, comendo o que era possível.

Enfrentando a lama, entre o 2º semestre de 1977 e o final de 1982, 220.064 migrantes, vindos principalmente dos estados do Sul, chegaram a Rondônia. Deixaram lá o que tinham, alguns apenas os familiares, para conseguir um pedaço de chão, enfrentar os piuns, os carapanãs, os anofelinos (malária), e o trabalho inacabável de derrubar a mata, queimar, abrir estradas, preparar a terra, semear, colher, e, carregando o cacaio nas costas, levar seus produtos por quilômetros e quilômetros de estradas de terra (ou lama?) até os compradores. Assim se construiu o estado de Rondonia.

Ninguém suponha que as derrubadas e queimadas foram feitas por "predadores da natureza". Quase três quartos da área total do estado ainda é mata virgem. E nenhum outro no Brasil tem maior percentual de seu espaço protegido por áreas de conservação e preservação ambiental, definidas em Lei.

Nos anos 50 e 60, a garimpagem era o grande foco de atração de migrantes, e o crescimento populacional não tem o mesmo ritmo das duas décadas seguintes. A partir de 1978 até o início da década de 90, quase um milhão de pessoas vieram construir o novo estado de Rondônia.


O final dos anos 70 e anos iniciais da década de 80 assistiram a maior intensidade da migração para Rondônia. O crescimento da produção agrícola mostrado na tabela demonstra que o trabalho na agricultura era o objetivo principal dos migrantes. Em 20 anos, um trabalho hercúleo foi realizado: a mata foi conquistada, a malária suportada e, apesar das limitações tecnológicas e muito desconhecimento da realidade regional, a produção agrícola cresceu 1.660%.
(Fonte: Planafloro)

FOTOS DA INTERNET: Rio Madeira, em Porto Velho e Ferroviária de Guajará-Mirim

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